Dito 50 : Romance da tia Angelina
Santo Tomé
dende a Moradelha
Romance da tia Angelina
A Moradelha
Marchou Angelina um dia,
à Cortiza, sua boa hortinha,
co seu can, o Moro, no pé,
sua negra mandeletinha.
Negro na cabeza o pano
e negrinho tamém o can.
Na porta da Moradelha
recebe-a uma sobreira,
meirande de todo o lugar.
Vai subindo o outeiro,
ja arrecendem as ervas,
arrecendem-lhe os pinheiros.
E sobe pola costinha,
alumeada por horténsias,
que enchem toda uma beira,
casinha de Felicitas.
As suas pétalas azuis,
enchem a sua alma a bicos.
A correr vem um cancinho,
Pidindo seus alouminhos,
choutando por riba dela,
ela venha a cofea-lo.
Tamém quere jogar co Moro
mais o Moro ja vai velho.
Parmada vendo as varandas
com rosas de muitas cores,
ja cheiram algumas delas
aromas que som amores.
Varandinhas floreadas
dando-lhe vida à casinha.
beirinhas de pedra laje,
bordinhas de flor donzela.
Cerdeiras, ja choridinhas,
fatoeiros ja com verdor,
valado da parra virgem,
valadinhos cheios de amor.
Divino marquinho de ouro.
Murinho cheio de glicinas,
que ja logo arrecenderam
aquel cheiro de baunilhas.
Hortinha de ervas do cedo
arrodeada da roseira.
Segue subindo Angelina,
é manhá de primavera.
Ja lhe falam os tulipáns,
erguendo bem o seu pescozo.
Umas nogueiras verdinhas,
enche-na toda de gozo.
Tremem cepas do Monea,
rabeando por rebrotar,
rabeando por enramar,
por botar folhas a voar.
Castinheiros desfolhados,
sen sequer ansia a espertar.
Figueira junto um poleiro,
voo de aves ao ela pasar.
Ja canta o cuco no alto,
alí anda Domitilia,
sempre fazendo na horta.
Peró entom, tia Angelina ?
Vou ata a Cortiza, filha !,
a fazer uns quatro regos.
Vaia a modo naicinha !
Vou, com iste churumelo !
José, que vénche das pinhas.
E logo o Moro vai coxo ?
Bo, o que vai é velhote !
Pois leve tino cos tojos.
Tem que ir polos Alvites,
senom nom dará pasado,
está moi mal o caminho,
tem silvas, está atacado.
Hai boa colheita, José !,
o saco bem cheio de pinhas !.
Si, chega-lhe bem a cousa.
Vaia com Deus, Angelina !
De vez a quando sinte-se
música de cara ò Mesóm,
da radio de José Manoel,
gosta-lhe ambientar o eido.
Ja no Alto, Angelina
sintiu as campás ao longe,
tocavam na Presoria,
seica mala nova hoje,
debeu morrer a tia Celsa.
Pobrinha bem mal andava.
Angelina deu a volta,
ja nom chegou à Cortiza.
Ía coa sua peta no lombo,
co Moro no pé, de volta
e baixava a Moradella
com claror que coronava.
Baixávache aquela costa
que tantas vezes subira
e vinham-lhe os recordos
vividos coa amiga Celsa.
Com essa perda anunciada,
ía olhando ao longe.
Meu Deus dizia, dizia,
quanta paisagem, paisagem.
Quantos outeiros e montes
vem-se dende aqui en riba.
Viraventos da Canhiza
por riba da Fontefria.
Alá, castro de Castromao
nas terras de Celanova.
Cartelle diante dos olhos
e case, o campo da feira.
A sua secular igreja.
Altiplanhino de Sande,
tamém Castelo de Sande
e o coto de Novelle.
Vexo as pericas do Bande
no seu campinho de erva,
arrodeado de maceiras,
uma choridinha beira.
Fumegam catro casinhas.
no médio da nosa aldea,
corona o fume de vida,
corona-me a lareira.
Coronava-me de moza
subir eiqui, noites de verao,
em noites com lua nova,
nom soinha, está bem claro,
atacado de estrelinhas,
um ceo de rapazinhas.
Quantas as idas e vidas.
Ai meu Deus !, quantas vidinhas.
Corona subir de dia,
bem cedo coa neboeira,
tornar a casa com choiva
em baixo duma sombrilha.
Sempre corona vir ela,
com vento, choiva ou com lume,
pra sentir istes airinhos,
olhar as fopas e o arume.
Onde renovam-se os pulmóns,
pensamento e o espírito.
Terra dos meus queridinhos,
ambrosia dos meus olhos.
Volveu pensar na Celsinha,
quando jogavam nas leiras,
quando eram duas meninhas,
entranto paciam as vacas.
Vou volver bulindo as Airas
pór roupinha de domingo,
pra velar minha amiguinha,
¡que no ceo esteja meu sol !.
Ja ela bem vestidinha,
marchou de cara ò velorio.
Ai Mundo Mundo !, Mundinho,
que tragos tam amargos, ho !
A Angelina Diéguez in memoriam
Letras Galegas 2020
Foto : / Santo Tomé, 10 de Outubro de 2010
Moradelha editora